quinta-feira, 3 de junho de 2010

Minhas Considerações: Táxi

Essa é fruto de conversas sobre a escalada da violência, a repressão da administração pública ao comércio irregular na cidade e as últimas notícias sobre a podridão na política nacional. À época (11/04/2009), três vezes por semana, era submetida a sessões de fisioterapia, em homenagem ao meu amado joelho esquerdo. Por isso, era e ainda sou obrigada a “passear” de táxi e, vez por outra, me deparava (e ainda me deparo) com figuras, digamos assim pitorescas, que abrilhantam o dia com comentários por vezes interessantes e por outras de extrema falta de discernimento e inteligência. Nesse dia não foi diferente.

Como de costume, entrava com dificuldade no veículo (o joelho ainda doía muito), me ajeitava no banco traseiro e colocava o cinto de segurança. Em seguida, repetia a mesma ladainha do itinerário até em casa: “nós vamos pra tal lugar, só que nós vamos fazer um caminho alternativo. A gente segue pela Avenida Q, no final a gente dobra à direita na Warwick Avenue, segue pelo Batalhão, depois direita na 5th Avenue e esquerda na Büchstrasse e já estamos quase em casa”. Nada mais chato que ficar repetindo isso. Dou graças a Deus quando encontro um motorista conhecido que já conhece o caminho.

Pois bem, voltando ao assunto que me trouxe aqui. Como havia falado, a viagem havia começado com a informação do itinerário. Seguimos viagem e o ilustre motorista teceu comentários sobre o tempo; nada mais natural, era um típico dia de outono no Rio de Janeiro, meio chuvoso, com muitas nuvens brancas e espessas enfeitando o céu, num jogo de esconde-esconde com o belo azul que apresenta nesta época do ano. Enquanto comentários sobre o tempo se seguem: “vai chover, não vai chover” (fico impressionada como conseguimos tornar esse tipo de conversa algo fascinante), eis que o motorista, tomado de certa indignação, passa a falar das operações que a prefeitura vem realizando para combater o comércio ilegal pela cidade, o chamado “Choque de Ordem”.

Falava ele sobre a retirada dos camelôs de vários pontos da cidade. Questionava a validade de tal ação, pois considerava que isso aumentaria a marginalidade. Resumia seu pensamento: “agora é que os assaltos vão aumentar. Em vez de deixar o pessoal trabalhar. É tudo pai de família”! Como se ser pai de família fosse salvo conduto para cometer irregularidades. Interessante que o nosso amigo não parou para pensar no que estava falando. Ao ouvir tamanha asneira, pensei comigo que a vida da maioria das pessoas é apenas definida como “sim” e “não”, “positivo” e “negativo”, parecendo não haver nuances, ou é muito bom ou é muito ruim. Fui obrigada a abandonar o meu silêncio para intervir.

Demonstrando insatisfação, comecei apontando que nem todos são “pais de família” como ele apregoava, que as ações tinham um objetivo mais amplo, muitos desses “trabalhadores” vendem coisas roubadas e irregulares. Embora não fosse adepta do prefeito (Pobre Rio de Janeiro), por um lado, achava as ações corretas em certa medida, pois pareciam estar organizando o espaço público, liberando as calçadas para os pedestres, fossem idosos, deficientes, com dificuldades de mobilidade, etc.; e por outro discordava da forma como tratava camelôs que vendiam suas produções caseiras, fossem roupas ou outros tipos de manufaturas e artesanatos, até os vendedores de frutas e alimentos dentro das regras de higiene.

E concluí dizendo que com esse pensamento ficaria fácil justificar tudo: “Se não tenho emprego vou ser camelô; se não posso ser camelô, vou assaltar. Assim fica fácil, todo mundo que perder o emprego vai ser camelô ou assaltante”. Expliquei que a proposta do administrador público parecia boa, pois, segundo ela, o camelô seria recadastrado e inserido em centros comerciais construídos pelo poder público. Sendo que os que não conseguissem se inserir nesses locais, receberiam assistência para que se qualificassem profissionalmente. Acrescentei que a idéia era boa, mas que não sabia se ela seria executada.

Nosso amigo, após ouvir a minha explanação, como num passe de mágica, concordou com o que eu falei não se dando o menor trabalho de pensar, se o que eu estava dizendo, fazia sentido ou algo parecido. Impressionante a capacidade das pessoas em não questionar o que lhes é apresentado. Fico chateada com esse comportamento. Parece ser mais fácil aceitar o pacote como chega. O problema é quando se abre o dito cujo. Pelo fato de não termos questionado sobre o que poderia haver dentro dele, podemos ser surpreendidos de forma bastante negativa. Dependendo do que seja, o prejuízo pode ser bem grande.

Parar para pensar, é uma capacidade que o ser humano poderia exercer com mais freqüência. Às vezes tenho a impressão que as pessoas acham que vai doer se pararem para pensar, ou que vão perder tempo. Pela preguiça ou pelo medo, acabam repetindo os mesmos erros por anos a fio, o que por fim se reflete em suas vidas e na vida pública, ao repetir o apoio eleitoral a candidatos de índole duvidosa.

Parece óbvio que o problema também reside na má educação ou na falta de educação adequada para formar seres humanos cidadãos, conscientes da coletividade e não apenas preocupados com o seu próprio umbigo. Insisto, não é educação de ler e escrever, é educação de ler, escrever, conhecer, criar, respeitar, ir além do óbvio, de amar, de gostar de saber mais e produzir coisas positivas e benéficas com isso.

Sabe que no final das contas o cara tem razão? Acho que vou virar camelô ou assaltante. Melhor ainda, me candidatarei a algum cargo político; se bem que é quase a mesma coisa, apenas com uma vantagem: não preciso temer a Polícia.

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